A maior eleição do mundo e o nacionalismo hindu João Alfredo Lopes Nyegray* O ano de 2024 está sendo considerado o superano das eleições pelo mundo. Ao todo, mais de 50 países terão pleitos variados, dentre os quais o Brasil e os Estados Unidos. A existência de eleições, no entanto, não significa necessariamente que a democracia vai bem. A qualidade e a integridade das eleições, bem como o contexto mais amplo no qual elas ocorrem, são fatores cruciais para determinar a verdadeira saúde democrática de um país. Em muitos regimes autoritários, eleições são realizadas como uma forma de legitimar o governo, mas estas são frequentemente manipuladas, como possivelmente ocorreu na Rússia – em que Vladimir Putin “ganhou novamente” e como muito provavelmente ocorrerá na Venezuela. É nesse contexto de eleições amplas que ocorreu, durante 44 dias, a maior eleição do planeta na Índia. Mais de 10% da população mundial, cerca de 970 milhões de indianos, foram às urnas. A duração e extensão do pleito em sete fases têm relação com a grande diversidade geográfica, étnica e linguística do país, que possui 22 idiomas oficiais. Conduzir eleições em fases permite uma melhor gestão e organização. Em algumas áreas, especialmente aquelas propensas a conflitos como a região da Caxemira ao norte, essa abordagem facilita o deslocamento de forças de segurança para garantir uma votação pacífica. Após a conclusão de todas as fases de votação, que ocorreu no sábado, 1.º de junho, a Comissão Eleitoral da Índia (ECI) organizou a contagem dos votos. Nesse pleito, é quase certa a vitória do atual primeiro-ministro Narendra Modi. Nascido em 1950 no estado de Gujarat, em uma família de classe média baixa, Modi se envolveu com o Rashtriya Swayamsevak Sangh (RSS), uma organização nacionalista hindu, em uma idade jovem. Tendo iniciado sua carreira política no Bharatiya Janata Party(BJP), rapidamente subiu nas fileiras do partido. Ele se tornou o Chief Minister (CM) de Gujarat em 2001, posição que ocupou até 2014. Modi foi eleito primeiro-ministro da Índia em 2014, após uma campanha que prometia desenvolvimento econômico, governança eficaz e combate à corrupção; e reeleito em 2019 com uma margem de votos ainda maior, refletindo sua popularidade sustentada e a aceitação de suas políticas. Sendo amplamente reconhecido por seu foco no desenvolvimento econômico e na modernização da infraestrutura indiana, Narendra Modi lançou projetos como "Make in India", "Digital India" e "Smart Cities Mission" para impulsionar a industrialização, a digitalização e o desenvolvimento urbano do país. Esses programas têm ressonância significativa entre eleitores que desejam ver a Índia como uma potência econômica global. Juntamente com o BJP, o primeiro-ministro tem promovido políticas e narrativas que fortalecem a identidade hindu. Isso inclui iniciativas como a construção do templo de Ram em Ayodhya e a revogação do artigo 370 da Constituição indiana, que concedia status especial à Caxemira, uma região de maioria muçulmana. Estas ações têm um forte apelo entre a população hindu, que vê essas medidas como uma reafirmação de sua identidade cultural e religiosa. É justamente nesse contexto de apelo aos hindus que vem as acusações contra Narendra Modi: a de promover perseguição religiosa à imensa minoria muçulmana (cerca de 200 milhões de pessoas do país de 1,4 bilhão de habitantes). Embora Modi pudesse utilizar suas reformas ou o crescimento econômico do país como mote de campanha, ainda no início das eleições seu discurso foi muito pautado por questões religiosas. O premiê chegou a acusar os opositores de serem “pró-muçulmanos”. Líderes do partido do primeiro-ministro e aliados frequentemente usam uma retórica que críticos consideram inflamatória e divisiva, com comentários que insinuam que muçulmanos são uma ameaça à segurança nacional ou que questionam seu patriotismo. Essas ações e declarações são vistas por muitos como contribuintes para a crescente polarização religiosa na Índia, onde os muçulmanos, que constituem cerca de 14% da população, frequentemente se sentem marginalizados e inseguros. Em pouco tempo, teremos a confirmação da vitória do BJP e de que Narendra Modi seguirá para um terceiro mandato, comandando a 5.ª nação de maior PIB do planeta e que, em breve, deverá suplantar os EUA em proeminência econômica. Cada vez mais, devemos voltar nossos olhares para Nova Déli. *João Alfredo Lopes Nyegray é doutor e mestre em Internacionalização e Estratégia. Especialista em Negócios Internacionais. Advogado, graduado em Relações Internacionais. Coordenador do curso de Comércio Exterior e do Observatório Global da Universidade Positivo (UP). Instagram: @janyegray
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